por Marcelo Mendez
Era uma noite de Outubro de 2020, eu sei.
Mas ecos de um tempo sombrio bateu fortemente na minha memória enquanto esperava por um jogo de futebol e diga-se; esperava única e tão somente por dever de ofício. Longe daquele menino torcedor que assistia os jogos da Seleção Brasileira com ávido interesse.
Há muito tempo deixei de ser menino, trocando o encanto do verso, a luz do lúdico, pelo pragmatismo óbvio da vida adulta.
Sou Jornalista e como tal, tenho o fato diante da minha frente; Caros leitores, tivemos ontem uma noite “Pra Frente Brasil” na vida futeboleira Brasileira. E isso, pelo pior que se possa imaginar.
O icônico tema musical da seleção de 1970 virou trilha sonora para os maiores 11 homens que já pisaram a Terra para jogar futebol. O maior time de todos os tempos pisou o estádio de Guadalajara para provar que a perfeição era possível, que o sonho era viável, que a poesia plena vestia chuteira e camisa a amarelinha. Mas não, leitor, não teve nada disso. Como falei, a reminiscência da memória foi a pior possível.
Em 1970, o Brasil vivia o chumbo pesado da Ditadura Militar e do AI-5 o artigo que caçou todas as liberdades individuais dos Brasileiros arrochando ainda mais a repressão. Nesse contexto a seleção de futebol foi usada escancaradamente como uma propaganda de um Brasil legal, maneiro, dando uma passada de pano nessa realidade. O Presidente Médici tinha lá a imagem do Velhinho boleiro de frente a tv vendo futebol e tudo parecia muito bem. Bem…
Passaram-se 50 anos. Não temos mais os porões de tortura institucionalizados, temos liberdade para se expressar (por enquanto…) como faço agora, mas algumas práticas novamente nos assola.
O Brasil jogou ontem. A partida aconteceu em Lima e a tv aberta que cobria esse time desde muito tempo não o transmitiria. O povo Brasileiro que vem sendo afastado sistematicamente dos estádios, agora também será afastado do direito de ver a Seleção na tv. Ou paga ou vê A Fazenda na tv do bispo. Mas eis que os anos 70 batem à porta!
A Tv Brasil chegou em baixa definição, com muita bajulação, insistindo em efusivos abraços ao Presidente da República ao longo dos 90 minutos que a peleja durou. Um histriônico narrador e um antigo bom comentarista a todo instante faziam questão de lembrar do mandatário nacional.
Não tem Problema nisso.
O Jornalista, assim como todo cidadão tem direito adquirido de ter o seu lado político, sua preferência ideológica assegurado pela decência da sociedade em respeitar essa escolha. Concordar, discordar, faz parte dela. Mas respeitar acima de tudo.
Todavia a questão que se coloca aqui é a forma de como isso se dá. Vocês que assistiram a peleja ontem, acham mesmo que o que houve ontem durante aquela transmissão era necessário? Tudo que foi dito foi por convicção ideológica e profissão de fé? Qual foi o sentido de toda aquela bajulação?
Também não me importo de ter que pensar essas questões. Mas me preocupa muito a repetição dessas perguntas que em algum momento da sociedade brasileira, já foram feitas ali por volta de 1975/76.
O que me assusta mesmo é saber que as respostas são as mesmas daquela época…
0 comentários