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FLUMINENSE DA AMÉRICA E DE NELSON RODRIGUES

5 / novembro / 2023

por Paulo-Roberto Andel

Horas atrás, numa das partidas mais tensas e emocionantes de sua história, o Fluminense enfim conquistou o único título que lhe faltava: venceu o Boca Juniors, hexacampeão da América, e levantou a sonhada Copa Libertadores.

A emoção tomou conta dos milhões de tricolores por todo o Brasil, especialmente no Rio de Janeiro e no Maracanã, palco da festa maior. Nos últimos dias, o barulho tricolor foi tão grande que deve ter constrangido alguns institutos de pesquisa, acostumados a estimar a torcida do Fluminense num tamanho bem abaixo do razoável.

Mas o que importa aqui é falar da conquista, da glória eterna que a Libertadores ganhou por finalmente ter o Fluminense, artifíce e aríete do futebol brasileiro, em sua galeria de campeões. E, se a campanha teve menos dificuldade do que o esperado, a partida final multiplicou a angústia. Primeiro, porque o Flu tinha o jogo nas mãos mas deixou a vitória escapar nos 90 minutos. Segundo, por conta da pancadaria argentina, deixada solta pelo árbitro Roldán. E terceiro, por perder o jovem craque John Kennedy, expulso imediatamente após ter feito o golaço do título num chute magistral.

Acontece que o Fluminense é o time mais preparado do mundo para encarar dramas. À feição de seu ídolo, torcedor e maior escritor da história, Nelson Rodrigues, o Flu parece incorporar na alma roteiros dignos do maior dramaturgo brasileiro de todos os tempos, como se o êxtase da vitória andasse de mãos dadas com a tragédia no parapeito de uma cobertura, até que um trai o outro e o joga para a morte. Para a sorte do Flu, quase sempre quem vence é o êxtase, e foi isso que aconteceu mais uma vez neste sábado.

Quando um time ganha um título desse tamanho, todos estão de parabéns, dos funcionários mais humildes ao presidente do clube, dos jogadores iniciantes aos craques consagrados, dos torcedores mais dedicados aos ocasionais, todos, todos. Ninguém fica de fora. Porém, vale o destaque para nomes como o incansável Jhon Arias, o espetacular Germán Cano e o fabuloso John Kennedy, que incendiou o Maracanã como nos tempos de outro artilheiro baixinho, favelado e monstruoso: Romário. JK chegou a ser massacrado na mídia, quase foi dispensado do clube mas voltou e agora marca seu nome na história.

A decisão não foi uma partida brilhante, mas emocionante ao extremo. Lembremos o roteiro de Nelson: a glória beijando a tragédia na boca e uma pronta para assassinar a outra. Um dos jogos mais tensos da história tricolor para quem estava no Maracanã, na televisão, nos telões, radinhos e de qualquer maneira pelo país afora. Qualquer lance pronunciava a desgraça, uma simples perda de bola tirava o ar do peito. Mas como escreveu monumentalmente no hino, Lamartine Babo cravou o destino: “Vence o Fluminense”.

Lutando contra boicotes, a má vontade midiática, edições de torcida e tudo que se possa imaginar, o Fluminense repetiu sua sina: a de mosca na sopa, a de time do último minuto que desafia prognósticos e definições, que carrega uma camisa pesada de vitórias e que, para sempre, sepulta a tristeza de 2008. Mas vejam que o Flu não é de brincadeira: naquele vice-campeonato, tirou do caminho os multi campeões São Paulo e Boca Juniors. E agora, para conquistar o sonhado título, também tirou da frente quatro campeões da Libertadores: Argentinos Juniors, Olimpia, Internacional e o próprio Boca, hexacampeão.

O Rio de Janeiro, tão sofrido nos últimos anos, vive uma noite inesquecível: enquanto os Red Hot Chilli Peppers e Roberto Carlos detonam em seus shows, a mocidade independente do Fluminense faz seu réveillon particular para milhões. Há rivais que aplaudem e entendem, enquanto outros destilam rancor e inveja. Quer coisa mais parecida com os críticos de Nelson Rodrigues? Não há.

Para fechar, a data da decisão não podia ser mais propícia: 04 de novembro, logo após o Dia de Finados. É que o Fluminense tem uma multidão muito viva, mas tem um verdadeiro esquadrão já na eternidade – só que este também está muito vivo e presente. Assim sendo, formou-se um composto imbatível para que meu amigo Marcelo Diniz cunhasse a expressão definitiva: a paz eterna.

Diante do grande campeão da América me ajoelho e choro, recordo meus pais, sonho com meu irmão, penso em minha mulher e em todas as pessoas, todas, que choraram e riram muito nas últimas horas. Afinal, tal como tem sido há mais de 120 anos, o Fluminense venceu, o Fluminense é o espetacular campeão da América e pouco importa se não é um time perfeito. Tem defeitos, é humano e vitorioso.

Mais uma vez parafraseando o maior dramaturgo brasileiro: “E é só”.

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1 Comentário

  1. Eduardo Felipe

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