por Péris Ribeiro
Só quem viu de perto aquele frisson, é que pode avaliar a força da massa atleticana. As ruas de Belo Horizonte estavam que era uma loucura só, desde a manhã de sexta-feira. E no tão aguardado domingo da decisão, os gritos de “Galo”, “Galo”, “Galo”, explodiam sem parar pelas ruas centrais – em especial, em plena avenida Afonso Pena, coração de BH.
Pouco depois das 12 horas, todo o bairro da Pampulha – onde fica o Mineirão – conhecia fenômeno idêntico. E quando o time do Atlético deu sinal de vida na boca do túnel, aí mesmo é que foi uma loucura só. Definitiva.
Os foguetes coloridos, papéis picados, faixas e bandeiras provocavam um visual de rara beleza, mas – para que negar? – ao mesmo tempo assustador.
E toda aquela loucura chegou ao ápice quando Reinaldo, simplesmente majestoso, liquidou a zaga do Cruzeiro – composta pelos destemperados Moraes e Darci Menezes – com dois antológicos dribles de corpo e, ante a saída de Raul em desespero, tocou no contrapé do goleirão cruzeirense, por cobertura. Sem dúvida, um dos mais lindos gols da história do estádio.
Eram decorridos 34 minutos. E, a partir dali, o que vi Reinaldo fazer em campo foi pura covardia. Ainda mais que, a assessorá-lo, estavam os tizius Paulo Isidoro, Marcelo e Marinho. E, lá no meio-campo, quem mandava, grandioso, era o incansável Toninho Cerezo.
Ainda por cima, quando o ataque daquele respeitável Cruzeiro, campeão da Libertadores da América, pressionava, esbarrava na solidez de um Vantuir na zaga. E se até ele fosse vencido, restava então o paredão definitivo: o folclórico goleiro argentino Ortiz, com as suas bermudas coloridas, os longos cabelos loiros presos por uma tiara e a segurança de suas mãos enormes. Sem contar que possuía um reflexo que Deus me livre!
Mas a festa naquela tarde/noite, era quase toda mesmo do imparável Reinaldo. É que a sua noção de espaço na área, parecia coisa de alquimista. E os seus passes curtos procuravam, sempre, pelo companheiro no espaço vazio. Os seus dribles estonteantes, quase sem sair do lugar, eram de matar! E a lucidez nas finalizações do mais puro requinte, me encantavam ainda mais. Era como se tudo aquilo me fizesse descobrir no futebol, enfim, uma nova postura de centroavante – o velho homem -de- área.
Aos 21 minutos do segundo tempo, quando Reinaldo deu uma boca genial nos atormentados Darci Menezes e Morais e tocou na medida para a oportuna finalização de Marcelo, aí mesmo é que não dava para se racionalizar mais nada no Mineirão. A loucura, a santa loucura da massa atleticana, assumia ares definitivos!
Pouco depois, estava lá o juiz Dulcídio Wanderley Boschilia a apitar o final de tudo. E o Atlético, com aqueles 2 a 0 em cima do poderoso Cruzeiro de Piazza, Zé Carlos, Raul, Nelinho, Joãozinho e Palhinha – recém sagrado, campeão da Libertadores da América -, chegava ao tão sonhado título de campeão mineiro de 1976. E campeão invicto!
Lá embaixo, no campo, nos ombros da torcida em triunfo, Reinaldo não sabia se ria ou se chorava. Estava completamente atônito! Ainda mais, porque ouvia o estádio inteiro a gritar-lhe o nome, como o grande herói do jogo. Só que era um coro que soava diferente – e que, em pouco tempo, haveria de ecoar, vitorioso, por toda a cidade:
- REI,REI,REI… REINALDO É NOSSO REI!
Em troca, o rei só tinha palavras e carinhos para a massa:
- O título é todo para a nossa torcida. A massa do Galo é isso aí! Maravilhosa! Demais!
E então, olhando tudo aquilo, confesso que tremi nas bases. Era, mais uma vez, o espetáculo sem igual que só o futebol sabe proporcionar. Grandioso! A minar-me de vez as emoções. A libertar, enfim, a porção atleticana candente em minha alma.
E dizer que um molecote de apenas 19 anos – sorriso de menino, a iluminar- lhe a face não menos menina -, era o responsável por todo aquele instante de puro enlevo. Os pelos dos braços, num arrepio só. As lágrimas da comoção, a embaçar-me a visão…
0 comentários