por isso Paulo-Roberto Andel
Neste sábado Barbosa faria 100 anos. Ou faz.
Um dos maiores goleiros da história do futebol brasileiro, viveu 79 anos mas não teve paz depois dos 30.
Parece incrível que seu calvário tenha começado por ter sido vice-campeão do mundo. Logo ele, a elegância no gol a defender o Expresso da Vitória, o Vasco que foi símbolo de talento e conquista por uma década, base da Seleção.
Pouca gente sabe que, depois da decisão de 1950, Barbosa ainda jogou por muitos anos em alto nível como goleiro do Vasco e, a seguir, de outras equipes. E que chegou inclusive a voltar à Seleção em 1953. E que por pouco não jogou a Copa de 1954: acabou se contundindo, fraturando a perna, e não teve condições de voltar.
Todos os garotos dos anos 1980, feito eu, cresceram ouvindo histórias de Barbosa. O gol de Ghiggia, a desgraça. A perda do título mundial no Maracanã.
Com o tempo, passei a pesquisar a respeito, e aí entendi que tudo era muito diferente do que se falava, cochichava e se especulava.
Barbosa é um dos maiores jogadores da história do Vasco. Foi multicampeão pelo clube, inclusive continental.
Imagine o que era ser um dos maiores goleiros da história enfrentando os jogadores daquele tempo? Alguns dos grandes craques jogavam no Vasco, mas Barbosa enfrentou Zizinho, enfrentou Dida, Waldo, Didi, Garrincha, muitos outros e sempre foi um gigante.
A injusta perseguição desde 1950 foi uma cruz que Barbosa carregou, mas a desgraça maior veio em 1993, quando foi impedido de entrar na concentração da seleção brasileira na Granja Comary. O absurdo foi tamanho que outros jogadores, e que também não foram campeões do mundo, puderam fazê-lo em outras ocasiões. Barbosa foi impedido.
O ufanismo de 1950 levou muitas pessoas à ruína, inclusive ao suicídio, um tema proibido. Muita gente se jogou para a morte, tanto do Maracanã quanto em todo o então Distrito Federal.
E o mais impressionante daquela tarde gigantesca, quando infelizmente não ganhamos nossa primeira Copa do Mundo, é que os uruguaios venceram os brasileiros, mas na grande partida da vida que se seguiu dali por diante, muitos participantes em campo daquela decisão foram derrotados em ambos os países. Não são poucos os casos de jogadores daquele dia que terminaram suas vidas de forma muito sofrida e miserável.
Quem considerava a derrota de 1950 como o maior fracasso da história do futebol brasileiro, nem podia imaginar o que estaria por vir em 2014.
Quantas vezes celebramos tantos jogadores de qualidade incontestável que também não ganharam uma Copa do Mundo? Por que não deveríamos ter respeitado Barbosa desde sempre?
Poucos também entenderam que a perseguição ao grande goleiro também significaria a sua redenção. Morto há mais de 20 anos, hoje completando um século de seu nascimento, Barbosa é um nome falado, lembrado e discutido. Basta conhecer sua carreira para reconhecê-lo como um vitorioso, dos maiores.
É preciso que não apenas os vascaínos, mas os brasileiros em geral saibam de quem tratou esse grande jogador, esse grande goleiro.
Não devemos isso somente a Barbosa, mas também à nossa própria história, à nossa grandeza.
Esteja onde estiver, que ele saiba da gratidão de muitos e muitos torcedores que sequer o viram em campo, que só o conheceram pelo semblante sofrido decorrente das perseguições. Sofrido, porém sempre elegante e educado.
Oito anos depois da derrota para o Uruguai, o Brasil conquistou seu primeiro título mundial. Provavelmente aquilo não teria acontecido se, antes de 1958, não tivéssemos uma geração de grandes jogadores dentre os quais se encontrava Barbosa, e ela mesmo sucedendo a outras gerações, como a que tivemos nos anos 1930.
O futebol brasileiro foi uma evolução, um progresso, um longo processo até chegar a se tornar a grande referência mundial durante muito tempo. O penta nunca foi sorte, mas talento.
A verdade é implacável: Barbosa vive. E viverá.
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