texto: Sergio Pugliese | foto: Guilherme Careca Meireles
Léo do Peixe é daquelas figuras obrigatórias em qualquer resenha. Camisa 10 do Caldeirão do Albertão, outro dia contou uma história digna de roteiro de cinema. Envolvia o churrasqueiro Sandrinho e Pai Juca, uma das tantas figuras que brotam naquela pelada, sempre às 10h, de domingo, no Grajaú. Igreja Universal em alta e os padres católicos cantores atraindo multidões, ele vivia uma crise de clientes. Na pindaíba, resolveu apelar para a publicidade e publicou um anúncio no jornal prometendo “reativar pessoas falecidas”. O cenário seria o próprio campo, vizinho da Floresta da Tijuca. Mas seria preciso um parceiro para ativar o plano celestial. E aí entrou em cena Sandrinho, pinguço dos bons.
– Pior que o anúncio deu resultado – contou Léo, durante divertida resenha no Albertão.
Os interessados em “conversar” com entes queridos do andar de cima começaram a aparecer. O primeiro foi o advogado Aderbal, curioso em saber se o primo Lucas estava realizado no paraíso. A consulta custava R$ 60 e era simples. Uma conversa rápida no bar para um passe-descarrego e o ápice, a esperada viagem ao além, no campo, cercado de mata. A essa altura, o coadjuvante Sandrinho já estava escondido entre os arbustos com uma cordinha amarrada a alguns galhos. Quando ouvisse Pai Juca cantar “balança a roseira!” ele deveria puxar a cordinha freneticamente, sinal claríssimo de que o falecido dera sinal de vida.
– Eles ganharam um bom dinheiro, chegou a formar fila – garantiu Léo.
– Mas o Betão permitia isso? – quis saber o bisbilhoteiro Guilherme Careca Meireles.
Verdade, Beto Ahmed, dono do campo, desconhecia o fato. As sessões eram em dias de semana, à tarde, enquanto ele trabalhava. E Sandrinho, além de churrasqueiro também é o caseiro, o que facilitou a operação.
– Mas um dia quase deu problema – recordou Léo do Peixe.
Foi quando o militar Hamílcar marcou uma consulta para saber notícias do amigo Tom, morto num assalto. Acostumado a treinar em selva fechada e enxergar inimigos com roupas camufladas em esconderijos improváveis, o sargento suspendeu a sessão quando as plantas começaram a se mexer. Quase pulou o alambrado para ir atrás de um vulto, que jurou ter visto, mas foi contido pela reza e a lábia de Pai Juca. Ele argumentou serem comuns esses delírios e deu cortesia ao desconfiado milico. Nesse dia, Pai Juca quase demitiu Sandrinho do cargo de balançador de roseiras.
– E por onde anda o Pai Juca? – perguntou Betinho Cantor, que também costuma ter alucinações, após suas visitas ao estacionamento do Albertão.
A última “aparição” de Pai Juca foi há dois meses. Chegou atrasado ao campo e mandou Sandrinho correr para a mata porque o casal Sheila e Afrânio estava chegando. Na pressa, não percebeu o estado etílico do parceiro. Enquanto Pai Juca limpava a mesa do bar, Sandrinho, trôpego, foi guiado pelos deuses até sua área de atuação. Antes de desmaiar, enroscado na cordinha, ainda ouviu vozes ao fundo. Só não captou Pai Juca cantar “balança a roseira!”. Na terceira tentativa, Pai Juca afugentou o casal ao esgoelar-se “balança a porra dessa roseira, caceta!!!!”. Claro, a sociedade foi desfeita, Betão perdoou Sandrinho e Pai Juca está cantando em outro terreiro.
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