por Zé Roberto Padilha
Baianinho foi jogador do Corinthians durante um ano e meio. A despeito do que posso ter acontecido em sua passagem pelo Parque São Jorge, jogando bem ou mal, sendo campeão ou não, o fato de ter vestido uma camisa tão carismática o credenciava a ir jogando Brasil afora. Bastava na apresentação ao seu novo clube dizer: “Eu joguei no Corinthians”. Na pior das hipóteses, conseguiria uma semana de testes para suprir a curiosidade ante tal credenciamento.
Dessa maneira, ele se apresentou ao Goytacaz FC e meio fora de forma, 28 anos de luta, conseguiu autorização para mostrar seu futebol em dois coletivos. Cobra criada se saiu muito bem. Porém, melhor do que ele se saiu seu empresário. Vocês lembram como se apresentava um vendedor de aspirador de pó? Era o próprio, terninho tão claro quanto sua pele, maleta 007 fase Sean Connery, cinto com as suas iniciais e um estilo inovador de vender seu produto.
Em vez de manter a classe que todo empresário deveria ostentar, sentar nas cadeiras ao lado da diretoria para mostrar seu jogador, foi para as arquibancadas torcer e misturou-se aos fanáticos, desocupados e aposentados que todas as 4ª e 6ª assistiam aos coletivos. Quando Baianinho pegava na bola, o grupo todo batia palmas. E desculpava seus passes errados com um “Valeu, Baiano!” bem nítido.
Enquanto o treino corria ele dissertava para a galera seus feitos. Do passe que deu para o Sócrates fazer um gol decisivo. Do gol que ele próprio marcou contra a Juventus, na Rua Javari.
E quanto ao Zé Maria? Quem não conhecia o lateral da seleção brasileira, o Super Zé, ficou sabendo do carinho pelo Baianinho. No Corinthians, eram como irmãos E o azar que ele deu? Moço bom, família para criar, o fato é que com 20 minutos de treino a arquibancada o queria não só vestindo camisa 7 do Goytacaz FC, como na semana seguinte o queriam na TV ao lado de J Slvestre, no seu comovente “Essa é a sua vida”.
Com 30 minutos de treino o Baianinho meteu um gol e eu, dentro de campo, por mais acostumado que estivesse com a extensão daquele burburinho, fiquei assustado com tanta gritaria. Como era seu primeiro coletivo achei que tinha trazido consigo a família inteirinha, o que era até a válido, mas como os comentários surgido antes do segundo falavam apenas do empresário e seu inovador estilo, eu tive que me render ao talento de ambos.
Pois mesmo contando com dos pontas direitas nosso presidente se viu no obrigação de atender ao clamor da massa, que já ganhava as rádios e jornais, e o contratou por um ano. Até que não foi mal o Baianinho. Pena que sua intimidade com a bola não ficasse apenas na habilidade e no domínio, ela ia além e ambos se confundiam no formato.
Mesmo quando atingiu o melhor da sua forma a balança marcava dois acima. E era uma luta sem trégua com o peso que foi cedendo a favor da Fililizona à medida que foi se desmotivando. Preterido pelo treinador Pinheiro, foi se acomodando e nós acabamos sem poder contar com o seu grande futebol. Eu, particularmente, era um apaixonado pela maneira como protegia a bola, a facilidade como conseguia, a despeito de sua bagagem lateral, estar sempre bem colocado e driblar sem usar a velocidade. Ele driblava era com o talento mesmo.
Mas não foi apenas por suas autuações, dele e do seu empresário, que descrevo sua passagem por Campos. Foi por uma entrevista concedida a TV Norte Fluminense em horário nobre. Indagado se a interrupção do campeonato poderia ou não trazer benefícios ao time, Baiano respondeu que o problema seria o “Relaxismo: que poderia causar a perda de entrosamento da equipe.
Se fosse jornalista do Pasquim, passava, poderia ter seu neologismo assimilado pelo próximo Aurélio. Mas foi proferido num clube de futebol onde o regime sobrecarregado de homens convivendo juntos nâo é capaz de perdoar tais deslizes. Pegaram no pé do Baiano é ficou um tal de relaxismo pra cá, Baiano você calado é um autêntico descendente de Castro Alves pra lá que, desesperado, recorreu em última instância à sua mulher. Que era professora.
Ela fez o que pôde, recorreu até a Barsa do vizinho, e só encontrou relaxado, relaxante, relaxismo que era preciso para relaxar seu tenso marido, nada.
Porém, sugeriu que alegasse ser uma força de expressão comumente usada em sua terra natal. Dia seguinte ele pirou ainda mais as coisas tentando se explicar. O clima era de deboche e melhor teria sido que aceitasse e não apelasse incluindo a mãe alheia diante de cada revide. Mas não o fez.
De gozador a brincalhão, se fechou. Seu comportamento introvertido em nada ajudou e seu futebol se encolheu também. Foi pro fundo do ônibus e se instalou na última poltrona e pouco queria conversa.
Só voltamos a ouvir sua voz em itaperuna, após um Goitacaz 2×2 seleção local. Um vendedor de picolé, atendendo seus insistentes apelos pois sua sede era maior que a de todo mundo, se instalou debaixo da sua janela. Jorge Luis, nosso goleiro, quatro poltronas adiante pediu para ele comprar um picolé. E o Baianinho, em péssima fase literária, foi gentil mas antes de comprar perguntou : ” De que marca?” Jorge Luis nem deixou quicar ” “Fiat”. Novo caos. Alguém disse para ele continuar com seu relaxismo que era melhor e doia menos aos ouvidos.
Essa expressão, que ele mesmo criou, parecia descontrolar o Baiano, que voltou a xingar a sede do clube. Que era, segundo ele, pequena e só podia abrigar gente pequena e sem respeito.
Nova introspecção. Baianinho deixou o Goitacaz tres meses depois. Fez muitos amigos, mas não conseguiu apagar do placar do Ary de Oliveira e Souza sua adversidade maior: Relaxismo 1x Baianinho 0. Placar final.
* crônica do livro “Futebol: a dor de uma paixão!”, 3* edição.
Excelente ,Caro Padilha nosso futebol outrora pródigo em apresentar craques,também o era em apresentar contos e casos hilarios ao extremo.