por Zé Roberto Padilha
Se doeu em mim, que sou torcedor do América, fico a imaginar como doeu nele, que nasceu praticamente dentro daqueles vestiários. E viu seu campo de futebol se transformar em um parque de diversões. Falo do meu primo Geraldinho, filho de Remo Righi, diretor emérito do Entrerriense FC, durante longos anos, e neto de um dos maiores presidentes que passou pelo clube carijó. Nosso avô foi quase uma lenda por lá: João Pereira Lopes. Desde então, anda triste e cabisbaixo ao ver o campo destruído daquele jeito. Foi, com a sua história de vida esportiva, uma verdadeira covardia.
Na casa dos meus tios, primos e avós, na Rua Presidente Vargas, o Entrerriense FC era tão cultuado quanto o Centro Espirita e o GATVC. E mais frequentado do que o Cine Rex e o Cinema Glória juntos. Geraldinho cresceu vendo Traíra, o maior camisa 9 trirriense, subir no segundo andar e furar as redes do nosso inesquecível Albino. Presenciou, também, Filhinho, uma categoria de quarto zagueiro, sair jogando de cabeça em pé com a bola dominada de dentro de uma grande área carregada de atacantes vermelhinhos. Era uma rivalidade saudável. E sem igual.
Em Três Rios, durante sua infância e adolescência, esteve enfiado nas arquibancadas antes da missa ou do culto, como quase todo mundo, torcendo para que o Abílio, ao lado do Jerques, superasse a zaga diabo, mais temida do que Trinity, do Far West, e Messala, de Ben-Hur, formada por Aziz, Nivaldo, Parafuso e Gilson.
Geraldinho não torceu por uma geração. Por quatro décadas, subiu aquelas arquibancadas para vibrar por todos os amadores e profissionais que vestiram aquela camisa alvinegra. E, portanto, ao contrário de muito diretores que por lá se sucederam, sentiu como se uma faca cortasse sua carne quando as primeiras estacas perfuraram a marca do pênalti. E outras, que foram erguidas para abrigar barracas com canudinhos e cocadas. Fora as do cachorro e do misto quente, que ficaram ali, fincadas na intermediária. E, mais uma vez, viu ser destruído o impecável gramado que deu ao clube tantas glórias, orgulho e respeito.
Pois se na história dos nosso clubes sociais o CAER tem como nobre seu salão, o Independência Clube a quadra do tamanho da sua história, é o campo, do Estádio Odair Gama, e não a sede, as piscinas, as lojas à sua volta que melhor representam a sua nobreza. Entrerriense Futebol Clube. É o futebol a sua razão maior de ser, está no estatuto, seu nome afixado à portaria. Só não respeita esta missão quem não quer.
Esta foto lhe foi enviada esta semana. Logo depois, parecia ter caído uma chuva miúda, meio fora de época. Na verdade, eram as lágrimas do Keka, do Canhoto, do Zé Coruja, de tantos que lutaram uma vida inteira, despejando súplicas para que aquele palco sagrado de competições fosse novamente levado a sério. Não virasse, como virou um dia, um parque de diversões.
Diversões fora do tempo e lugar podem vir a empanar a luta de tantos abnegados pelo esporte. E a gloriosa história do Entrerriense FC, e a paixão, do meu primo Geraldinho como eterna testemunha, não merecem passar mais por isto.
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