por Paulo-Roberto Andel
Faz mais de quarenta anos, mas eu me lembro como se fosse ontem.
Quando comecei a ter autonomia para ir sozinho ao Maracanã, fiquei louco. Antes, meu pai me levava a alguns jogos mas não a todos. Primeiro eu ia a partidas realizadas à tarde, mas pouco tempo depois já podia encarar as noturnas também.
Passei a economizar todas as moedas possíveis da mesada para poder ir a mais jogos, não somente os do Fluzão. Para esticar a grana, a saída era escolher alguns para ir de geral, bem baratinho, e outros de arquibancada. Precisava cortar uns sanduíches por mês, um sorvete, mas tudo bem. Contratações para o time de botão, moderadamente.
Alguns jogos passavam na TV, mas a maioria não. Só indo ao estádio para ver. Aquilo me tomou como uma febre interminável. Era bom demais ir ao Maracanã, pouco importando se fosse num clássico abarrotado ou num jogo de dois mil pagantes. Chegar cedo, ver o gigante em silêncio, as pessoas chegando aos poucos, a festa sendo preparada.
Tudo começava para mim na rua Figueiredo Magalhães, em Copacabana, geralmente em frente à galeria do saudoso Cine Condor. Lá tinha o ponto de ônibus e um pipoqueiro, então garantia o lanche antes de embarcar.
Tenho uma memória marcada pelo caminho noturno do ônibus 435, Grajaú x Leblon, pintado de laranja. Indo com meu pai, geralmente pegávamos o 434. Sozinho, eu escolhia o outro, talvez por ser mais rápido mas principalmente pelo caminho. Ele passava na porta do Fluminense e aquilo me dava uma sensação boa demais – por trás do enorme muro grená, ficava a história do meu amor todinho. Depois seguia pelo túnel Santa Bárbara – eu sempre gostei de túnel desde pequeno. Saía no Catumbi, fazia uma volta e logo se via o mar de andaimes e ferros da Marquês de Sapucaí, o Maracanã do samba. Ficava pensando em quanta gente vibrava ali no Carnaval.
Minutos depois, o 435 já descia a Presidente Vargas e começava a me dar um frio na barriga: em pouco tempo chegaria ao Maracanã. Em todo e qualquer jogo o frio batia e eu já pensava: estou chegando. Subir o Viaduto dos Marinheiros, descer na Praça da Bandeira, passar pelo ponto do CEFET e, ao entrar na avenida Radial Oeste, logo surgia à esquerda a imagem gigantesca do maior estádio do mundo. Era o Maracanã, era o palco, o jogo, o espetáculo. Eu saltava na UERJ e logo chegava à bilheteria, pertinho dos vendedores de laranja e amendoim.
Desde então, se passaram centenas e centenas de jogos. Vi decisões, grandes vitórias, derrotas acachapantes, alegrias, tristezas e lágrimas. Às vezes vou para o jogo de metrô, noutras pego Uber. O futebol mudou demais, o Maracanã agora é outro, não há mais clássicos com cem mil pessoas, nem a mão de meu pai para me puxar. Mas exatamente nesta madrugada lembro que irei ao jogo Fluminense x Corinthians neste sábado, e só de pensar nisso já me dá aquele velho frio na barriga, dos tempos da moedinha contada, um frio tão marcante que nem mesmo anos e anos de UERJ diariamente tiraram a emoção de chegar perto do Maracanã.
Faz quarenta anos, mas o sentimento é permanente. Tem tudo a ver com aquele bom presságio do enorme muro grená da Pinheiro Machado. A chama que movia o garoto, com seu saco de pipoca doce a caminho do Maracanã, não dá sinais de que vai se apagar.
@pauloandel
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