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AGARRA, MANGA!

8 / abril / 2025

por Luiz Cláudio Latgé

Por que um menino resolve ser goleiro? O que faz com que troque o encanto do drible, a euforia do gol pela difícil tarefa de guardar a meta, de jogar no limite conflagrado da área, o lugar onde segundo os cronistas não cresce grama? Fiz algumas vezes esta pergunta, enquanto vestia a camisa preta nos campos de pelada. A resposta ainda não é fácil, mas passa pelo goleiro Manga.

A história de Manga começa nos campos de pelada do Recife. É um dos heróis do Botafogo, de 59 a 68, o maior campeão da história do clube, 442 jogos e 20 títulos, num tempo em que, dizia, enfrentar o Flamengo era bicho certo. Imponente, com sua camisa preta, jogando sem luvas e exibindo os dedos tortos, de muitas fraturas, chegou à Seleção brasileira.

O goleiro nesta é época não era uma estrela, não era disputado no mercado do futebol, isso só iria acontecer mais tarde, a partir de Júlio Cesar. Mas, daquele tempo, o Brasil se lembrará de Castilho, Gilmar, Dida, Leão… E Barbosa, eternamente marcado pela derrota na copa de 50. Este é o problema: jogar numa posição que você será lembrado pelo que não fez, pela bola que não defendeu.

Era preciso ser um pouco maluco para jogar no gol, dizia-se. A posição impunha coragem para levar bolada, se atirar aos pé do centroavante, comer areia, porque nem sempre havia grama por ali, já falamos disso. Muita força física, e explosão muscular para reagir no reflexo a um chute à queima roupa. Ao mesmo tempo, cobrava técnica, para encontrar o melhor posicionamento a cada lance. Manga tinha todas estas qualidades.

Na pelada, a gente costumava jogar e narrar os lances como um locutor. ‘Atira no canto, é gol.’ Mas a frase que ficou na minha lembrança era outra: ‘a bola vai entrando e … espalma, Manga.’

Manga era o salvador da pátria, o último homem. Capaz de voar. Se esticava para tocar a bola com a ponta dos dedos, evitando o gol. E a ponte do goleiro talvez seja uma das jogadas mais plásticas do futebol.

Manga teve uma carreira longa. Jogou no Nacional do Uruguai e foi campeão da Libertadores. Jogou no time memorável do Internacional, bicampeão brasileiro, em 75 e 76, já perto dos 40 anos. Se aposentou em 82, aos 45 anos, jogando pelo Barcelona de Guayaquil, no Equador, campeão até o final.

Uma carreira tão completa que o dia em que nasceu, o 26 de abril, é lembrado no esporte como o dia do goleiro, em sua homenagem.

A fama, no entanto, não lhe garantiu boa vida. Teve problemas de saúde e dificuldades financeiras e foi resgatado pelo jornalista Sérgio Pugliese, do Museu da Pelada, há alguns anos e passou a viver no Retiro dos Artistas.

Pode parecer que o goleiro está ali para fechar o gol. Mas Manga fez mais do que isto. Em cada defesa, tocou muito mais que a bola para escanteio. Obrigado, Manga.

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