texto: Guillermo Planel | edição de vídeo: Daniel Planel | foto: Cesar Trindade
– Guixermo ou Guilhermo? – Guixermo, claro… A resposta, bem ali na porta, naquele aperto de mãos, desarmou o anárquico ator, iconoclasta ser, devastador de interlocutores desatentos.
– Pois eu sou do Alegrete, tchê.
A partir desse momento se materializou um outro personagem que eu não tinha imaginado, referência viva do cinema brasileiro, um homem de uma cultura pouco conhecida pela maioria dos espectadores de “Eu te amo”, “Iracema uma transa amazônica”, “Anchieta, José do Brasil”, “A dama do lotação” e dezenas de obras-primas do cinema nacional.
Um ator que foi amigo pessoal de Nelson Rodrigues, que trabalhou com Glauber Rocha, Neville de Almeida, Ruy Guerra, Cacá Diegues e dezenas de diretores sensacionais que transformaram a arte cinematográfica do Brasil em um espetáculo mundial, estava se apresentando na minha frente, de sandálias havaianas, quase franciscanas, para encarar mais algumas jornadas de trabalho.
Um personagem considerado por muitos como intratável, que deixou alguns diretores consagrados atônitos com seu comportamento imprevisível e fugidio, estava ali para narrar 15 filmes de três minutos. Aqueles três dias de trabalho com ele – imaginei que seriam os mais difíceis de minha carreira – pareceram ser, na verdade, trinta minutos de uma pelada na beira do mar ao entardecer. E olha que eu não jogo bola.
Mas foram trinta minutos de uma partida maravilhosa, instrutiva, repleta de suave torpor de vinho tinto e sabedoria, uma goleada de bom humor e refinada ironia. Ao final do trabalho, me dei conta que o personagem que todos lembramos como irreverente, cruel e sarcástico, é na verdade uma rara fonte de conhecimento de cinema, teatro, literatura e cultura em geral. O resto é lenda.
Percebi entãoque não podia deixar passar a oportunidade de pedir um depoimento para o nosso Museu da Pelada, lembrando suas participações históricas nas narrações do Canal 100. Uma poesia do futebol brasileiro que todos guardamos na memória, mesmo aqueles que não jogamos futebol, mesmo aqueles que somos brasileiros pra lá um pouco da fronteira sul. Do sul do coração.
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