por Marcelo Mendez
Futebol de várzea em dia de chuva me remete a épocas passadas em que o verso era farto e a bola marrom era intrinsecamente poética.
Aqueles eram tempos onde o futebol de várzea era acompanhado de boleias de caminhões, carretos e outras festas. Quem quisesse ver era só subir e partir para o barato. Foi um tempo em que o jogo acontecia com sol a pino, ou debaixo de chuva a cair aos cântaros. E quão belo era aquilo!
Para além dessa bobagem de “qualidade técnica do jogo”, aquelas partidas disputadas debaixo de chuva eram plasticamente épicas. Homens de camisas de algodão com números costurados nas costas, meias arriadas, encharcados de barro pelo corpo todo…
Eram verdadeiras esculturas humanas a perambular pelos sonhos, pelo meu imaginário. No final, o resultado pouco importava.
Último domingo viveu-se um tanto disso.
No meu Parque Novo Oratório, no campo do São Paulinho havia um jogo, aparentemente sem maiores pretensões onde dois times se digladiavam na cancha encharcada de barro e sonho. Meio que por profissão de fé, fiquei pra ver a peleja.
Em um dia de chuva, o futebol de várzea jogado sob céu cinza remete a algo melancólico, uma obra de Tchaikovsky, um jazz a lá Chet Baker.
No campo, uma partida que foi disputada por homens de uma dignidade comovente terminou em um 2×1 para o time de camisa mais escura, não procurei saber o nome, quero deixar assim; O time de camisa escura contra o time que outrora foi amarelo, cujo barro fez laranja…
Final do jogo.
Em meio a uma fria chuva que iniciava a tarde de domingo, os dois times saíam de campo.
Não ganharam nada material, não tinha repórteres a entrevistá-los, holofotes a clarear seus rostos adornados de lama, mas, aqueles times eram muito maiores do que as aparências tortuosas insistem em desdizer.
Os times de camisa escura e o de amarelo que o barro fez laranja foram no domingo último a resistência, a luta, a vontade de manter viva uma tradição.
De que domingo é dia de várzea.
Por tudo isso, a crônica de hoje vai usar esses dois times para homenagear os tantos outros que acreditam que o sonho pode ser mantido, seja sob sol, seja sob chuva.
Por tudo isso, agradeço a ambos.
Obrigado, caros…
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