por Marcos Vinicius Cabral
A bola, em um esporte onde tudo é relativo, ainda é, possivelmente, a única paixão existente na vida de um jogador de futebol.
Paixão essa que faz garotos irem buscar um sonho a ponto de deixar para trás Cabo Frio, Favela da Praia do Pinto e Quintino.
Mas sempre há algo a mais a se esperar dela e de quem a trate com zelo, antes do apito final do árbitro, que enlutado pela cor de seu uniforme, tem numa das mãos o minuto interrompido.
Esfera redonda que direciona o caminho que leva cada um de nós, pusilânimes e passionais torcedores ao estádio, onde sorrisos e lágrimas se digladiam no jogo das emoções no campo acinzentado e acimentado das arquibancadas.
Ali, somos crianças e precisamos ser.
Talvez a bola, seja a cabeça, o jogador o corpo e o torcedor o coração.
Talvez, quiçá, seja a leveza de uma folha caída da árvore e soprada pelo vento para longe, bem longe.
Quem sabe, esse objeto criado no século IV a.C. por Fu-Hi, um dos governantes da antiga China, seja na sua inocência, mais esplendorosa que o tatalar das borboletas no campo ou o das mariposas em seu giro frenético pelas luzes da cidade.
De uma coisa eu tenho certeza: a bola romantiza e precisa de carinho, precisa de atenção.
Ser carinhoso neste esporte em que o contato físico é frequente, é para poucos.
Ser atencioso, quando todos se preocupam em vencer a partida a qualquer custo na busca desenfreada pelo gol, mais ainda.
A bola sofre o pior de seu aviltamento, pois há sim, escassez de jogadores que não dão a ela o valor merecido.
Mas o mês de março nos traz à memória alguns carinhosos e atenciosos jogadores que foram ‘gentleman’ com a bola.
Dois deles fazem aniversário hoje: Júlio César Uri Geller, que completa 64 anos, Zico, 67 e daqui a duas semanas, Leandro, que vai fazer mais um ano de vida, chegando aos 61.
Um, vestiu a camisa 2, e foi ao lado de Djalma Santos e Carlos Alberto Torres, um dos mais completos laterais da história do futebol brasileiro.
Tão bom que passou boa parte de sua carreira no ‘Tempo de Bastilha’ com seus joelhos, e mesmo assim, chegou a níveis surpreendentes com os que produziu dentro das quatro linhas.
Vestindo a 3 em seus últimos anos de vida futebolística, saiu de cena contra o Bangu, na derrota por 2 a 1, em Moça Bonita, em 1990.
Foi gigante por natureza.
O outro, eternizou seus dribles e fez de uma tragédia pessoal (o incêndio da Favela da Praia do Pinto onde morava), o combustível para vencer como jogador de futebol.
Com a 11 rubro-negra, ajudou a conquistar o primeiro (1980) dos sete títulos brasileiros do Clube de Regatas do Flamengo.
Alegre, sempre com um sorriso no rosto quando recebia a bola e partia para cima de seus marcadores, Uri Geller não lembrava nem de longe o menino pobre que vendia amendoim na rua e guardava os carros dos frequentadores do Jockey Club.
Pulou os muros do seu clube de coração para fazer com Adílio, uma das parcerias mais sinceras do mundo da bola.
Hoje não são mais parceiros, pois viraram irmãos.
Monstro.
Já Zico… ah, o Zico, o Zico foi exemplo de dedicação, de amor à profissão, de companheirismo, de humildade.
Venceu com bravura os maiores desafios da difícil carreira que escolheu para sua vida.
Sim, fez isso com a mesma classe que driblava seus adversários e com a simplicidade de quem sempre buscou o gol.
Com a bola nos pés, foi o arco e a flecha e como a água, havia fluidez ao ultrapassar os obstáculos.
Nada o parava.
Se despediu do futebol naquela fatídica noite de 06 de fevereiro de 1990 e para muitos rubro-negros apaixonados por esse esporte, um dos maiores camisas 10 do futebol mundial de todos os tempos, deixou um buraco no peito tamanha saudades.
Zico foi grande e sua grandeza o tornou humano demais para se relacionar com as pessoas.
Sua vitória é ser um ser humano de carne e osso e de ser simples, sua maior (dentre tantas) virtude.
Chamado de bichado pela torcida tricolor em um Fla-Flu, fez três na única vez em que disputou um clássico ao lado do saudoso Dr. Sócrates.
Xingado, respondia à altura, porém, na bola.
Não foi campeão do mundo pela Seleção, pudera, é bem verdade, mas valorizou Cariocas, Guanabaras, Rios, Brasileiros, Libertadores e o Mundial.
No mais, qualquer definição que não seja gênio, soa como insanidade e causa irascibilidade em quem teve a chance de vê-lo jogar.
Craques, extrasséries, gênios, ou seja lá o que tenham sido, Leandro, Uri Geller e Zico, nada seriam sem ela: a bola.
Parabéns e muitos anos de vida!
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