Escolha uma Página

CAPITÃO DENÍLSON

por Elso Venâncio

Denilson Custódio Machado — ou simplesmente Denilson — foi o primeiro volante a ser chamado de cabeça de área no futebol. Nasceu em Campos dos Goytacazes, no dia 28 de março de 1943. Pelo Madureira, se destacou num jogo nas Laranjeiras, contra o Fluminense, anulando o ataque tricolor. Insatisfeito com os atrasos salariais e com moral após a partida, procurou o conterrâneo Pinheiro para se aconselhar. O ídolo Pinheiro havia deixado o Fluminense após 15 anos, mas tinha influência no clube.

— Fala direto e firme com Zezé Moreira e pede para treinar. Deixa o resto comigo! — orientou Pinheiro.

Forte, com 1m80, Denilson ouviu com surpresa a pergunta do consagrado e sisudo treinador:

— Meu filho, você é goleiro?

— Não, seu Zezé, sou meio-campo e dos bons.

Denilson não apenas foi para o Fluminense, como defendeu o clube de 1964 a 1973, tornando-se o sétimo jogador com mais atuações na história tricolor. Capitão e líder em campo durante tantos anos, recebeu do jornalista Nelson Rodrigues o apelido de Rei Zulu. Logo no primeiro pelo Fluminense, Denilson foi campeão carioca e chegou à Seleção Brasileira.

Nos treinamentos para a Copa do Mundo de 1966, na Inglaterra, imperava a desorganização. Foram convocados mais de 40 jogadores, reflexo de uma ditadura militar que usava o futebol do país bicampeão do mundo. Com a proximidade da Copa, o técnico Vicente Feola marcava reuniões com a presença dos convocados, para anunciar os cortes, pois só poderia levar 22 jogadores para o Mundial. Faltando poucos minutos para um desses encontros, Pelé avisou a Denilson:

— Preciso esfriar a cabeça. Vamos dar uma volta?

Denilson reagiu: “Se eu sair, estou cortado”.

— É o contrário… Se estiver comigo, ninguém mexe com você — rebateu o Rei do Futebol, que já era tetracampeão do mundo (duas vezes pelo Santos e duas com a Seleção Brasileira.

Denilson foi à Copa e atuou em duas partidas: contra a Bulgária, na vitória brasileira por 2 a 1, e contra Portugal, na derrota por 3 a 1. Pelo Fluminense, o volante teve 433 jogos. Além de 1964, também foi campeão carioca em 1969, 1971 e 1973. Conquistou a Taça Guanabara em 1966, 1969 e 1971, bem como a Taça de Prata, em 1970.

A maior decepção do Rei Zulu no futebol foi não ter sido lembrado para a Copa de 1970. No ano do tricampeonato mundial, o Campeonato Brasileiro — ainda conhecido como Taça de Prata ou Roberto Gomes Pedrosa (Robertão) — reuniu uma fartura de craques, já que os campeões no México estavam em campo e não era comum os clubes negociarem jogadores para o exterior. Enfim, o Fluminense conquistou o título no maior Brasileiro de todos os tempos. Time-base: Félix; Oliveira, Galhardo, Assis e Marco Antônio; Denilson e Didi; Cafuringa, Flávio (Michel), Samarone e Lula.

O grande capitão faleceu no dia 1º de outubro de 2024, aos 81 anos. Residia na cidade do Rio de Janeiro e lutou, ano passado, com problemas na próstata. Denilson é um ídolo eterno na história do tricolor carioca.

TRISTE FESTA SEM O INTERIOR

por Zé Roberto Padilha

Se há algo que melhor traduz a insensibilidade da FERJ ao nos afastar do Campeonato Estadual, marcando muitos jogos fora do estado, esse algo é o alambrado. Entre o jogador e o torcedor, havia cumplicidade. Era o cara a cara. O VAR era o olhar, a manifestação da multidão por entre as brechas dos arames.

Muitas gerações tiveram o privilégio de ter o futebol como lazer e entretenimento. Assim como o cinema, o teatro e a missa, ir aos estádios fazia parte do cotidiano.

“Juiz ladrão!” Que psicóloga não adoraria que seus pacientes tivessem a chance de manifestar o “ódio do bem”, a ira espontânea, exteriorizada e cultuada às 15h de uma tarde? Para isso, tinham o seu divã ao ar livre, a bola rolando ao vivo, com o alambrado entre eles e a maior paixão: o futebol.

Para nos tornar previsíveis como os ingleses, jogar como os irlandeses, a FIFA igualou os estádios e nos privou dos arquibaldos e geraldinos. A TV Globo, com o objetivo de nos tornar insensíveis, levou nossos clássicos para Brasília. E nossos filhos, para não serem hábeis como os Ronaldinhos, perderam seus campos de pelada e passaram a jogar Real Madrid X Barcelona no Playstation.

Escrevo de Três Rios, cidade do interior que, como tantas outras, perdeu o seu América x Entrerriense. Mais do que uma doce rivalidade, as crianças tinham o direito de entrar nas escolinhas e sonharem em se tornar jogadores de futebol.

Para isso, precisavam calçar chuteiras, não empunhar um joystick. Precisavam correr, brincar e se tornar cidadãos saudáveis, que é o objetivo maior de todas as modalidades esportivas.

Meu pai jogou futebol, eu e meus irmãos jogamos futebol, mas aos meus filhos e netos foi imposto um alambrado em 4K, entre eles e o direito de exercer um dom tão belo que, em Três Rios, era a marca e o orgulho da nossa família.

Quando digo a eles como era a emoção de entrar no Maracanã para disputar um FlaxFlu, mesmo com a vocação herdada, eles nem sonham mais com isso. Se os estádios do Entrerriense e do América não recebem jogos há anos, se a liga que organiza os jogos está fechada, todos os meus netos preferem guardar suas mesadas para ir ao Rock in Rio assistir a um show do Coldplay.

E assim, na essência, no nascedouro, com o distanciamento e abandono das competições no interior, a FERJ vai continuar a ter seus cofres cheios. E o futebol brasileiro, por sua vez, testemunhará o vazio que permanece na sua alma. Esse vazio vinha todo do interior. Onde, hoje, os locais que revelaram Mané Garrincha, o nosso gênio das pernas tortas, estão abandonados.

Em Pau Grande, distrito de Magé, onde o futebol começou, como em todo o interior do estado, só é possível viver o esporte pela televisão. Até quando? E nossa imprensa esportiva, que se acovarda e não se manifesta mesmo assistindo às razões de sua profissão escorrerem entre seus dedos?

RENATO, PERDOA-LHES, POIS NÃO SABEM O QUE FAZEM

por Marcos Vinicius Cabral

“É aquela coisa de amor e ódio. Se eles soubessem um pouco mais da vida do Renato, toda vez que ele entrasse em campo a torcida aplaudiria de pé”, disse Zico, ainda no vestiário do Maracanã na festa da 20ª edição do Jogo das Estrelas que aconteceu no sábado (28).

A declaração do maior ídolo do Flamengo era para responder ao repórter sobre as vaias direcionadas para o ex-camisa 7 rubro-negro.

Ora, se for para justificar a fala de Zico sobre amor e ódio, os torcedores não têm motivos algum para vaiar Renato Portaluppi.

Campeão da Copa União, em 1987, da Taça Guanabara, em 1988, e da Copa do Brasil, em 1990, pelo Flamengo, Renato encarnou como poucos a mística de “raça, amor e paixão” cantada pela torcida rubro-negra nas arquibancadas do Estádio Mário Filho quando vestiu o Manto Sagrado.

Boa parte dos que vaiam Renato Gaúcho certamente não viram o jogar. Nem ficaram sabendo por meio de pais e tios que o ex-ponta-direita foi o responsável pelo gol da classificação na vitória sobre o fortíssimo Atlético Mineiro de Telê Santana, no segundo jogo das semifinais da Copa União de 87. A partida foi no Mineirão e, além disso, Renato Gaúcho foi eleito o melhor jogador da competição.

Renato, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem.

Os mesmo torcedores que ano a ano vaiam Renato, não devem saber que na preparação para a Copa do Mundo de 1986, o ponta, mesmo chegando atrasado, entrou pelos portões da Toca da Raposa – Centro de Treinamento do Cruzeiro que era usado pela Seleção Brasileira – carregando Leandro enquanto alguns outros jogadores pularam o muro. Camaradagem, amizade e lealdade em uma única história.

O ato, de fato, custou caro a Renato que acabou não indo à Copa do Mundo no ano em que o camisa 7 voava.

Talvez alguns flamenguistas justifiquem a demonstração de desagrado coletivo pelo fato de que Renato não teve uma boa passagem quando dirigiu o Flamengo em 2021.

Mas os números não mentem: Renato Gaúcho é o segundo melhor técnico na era pós-Jorge Jesus com 72,8% de aproveitamento, ou seja, 24 vitórias conquistadas, oito empates e somente cinco derrotas. Jesus teve 81,6%.

Muitos neófitos rubro-negros não saibam que Renato chegou a ter 89,6% de aproveitamento pelo clube: em 16 jogos, obteve 14 vitórias, um empate e uma derrota. Os números, por mais irrelevantes que sejam para quem insiste em vaiar Renato, torna o treinador – atualmente desempregado e curtindo férias no Rio – como o técnico com o melhor início de trabalho na história do Flamengo, deixando para trás Sebastião Lazaroni e Jair Pereira (87,5% e 85,4% de aproveitamento, respectivamente).

Resta-me crer que as vaias toda vez que Renato Gaúcho pisa no gramado do Maracanã, seja dirigindo algum clube ou participando do Jogo das Estrelas, se devam ao gol de barriga marcado por ele no Fla-Flu de 95.

Uma baita injustiça!

Mas é preciso voltar no tempo e contar como chegavam Flamengo e Fluminense àquele 25 de junho de 1995.

O Flamengo celebrava o ano do centenário e tinha grandes jogadores. O principal deles era Romário, que chegou do Barcelona com status de melhor jogador do mundo após ser eleito pela Fifa no título da Copa do Mundo de 1994. Além dele, Branco também era uma das grandes figuras da equipe. Sem contar Sávio, um dos melhores jogadores do país na época.

Já o Fluminense convivia com salários atrasados e a chegada de Joel Santana no meio da campanha era a esperança dos tricolores que estavam com o grito de “campeão” entalado na garganta desde 1985. Renato era o destaque, mas aos 32 anos não gozava do melhor momento na carreira dentro de campo. Nos bastidores, o camisa 10 tricolor ajudava os que recebiam salário baixo e ajudava como podia.

O empate era do Flamengo, já que o time de Vanderlei Luxemburgo havia feito a melhor campanha no geral.

Mas nos Fla-Flus anteriores, o time das Laranjeiras levou a melhor duas vezes, na segunda fase: um 3 a 1 e, no turno do octagonal final, um 4 a 3. O outro jogo, na primeira fase, terminou empatado em 0 a 0.

Portanto, o último Fla-Flu daquele octagonal definiria o campeão. E foi o que fez Renato, ao marcar dois gols – um de barriga que foi creditado a Aílton na súmula pelo árbitro Léo Feldman – o camisa 10 tricolor silenciou boa parte dos quase 110 mil pagantes que eram maioria rubro-negros.

Renato, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem.

Mesmo que o gol de barriga seja o motivo para Renato ser vaiado todas as vezes que reencontra a torcida do Flamengo, já passou da hora de pararem com essas vaias.

O futebol agradece. Renato vai ficar feliz. As estrelas brilharão com mais intensidade no ‘mar negro’ ao entorno do Maracanã no jogo festivo do Zico. E o bom senso, perdido com as injustas vaias, vai voltar a prevalecer.

IDOLATRIA A ZICO

por Elso Venâncio

O Jogo das Estrelas virou tradição no calendário do futebol brasileiro, especialmente do futebol carioca. É aguardado pelos rubro-negros e por torcedores rivais, que vestem a camisa do seu clube e vão ao Maracanã. A maioria da galera se programa, e vem gente de todo o Brasil. Isso ocorre também no cruzeiro anual “Emoções”, de Roberto Carlos, iniciado em 2005, um ano após o projeto vitorioso de Zico. O Rei da Música Popular Brasileira esclareceu numa coletiva: “Pelo menos 60% dos fãs são os mesmos. Quem vem, volta”. 

No intervalo do 20° Jogo das Estrelas, no último sábado (28), Zico se emocionou com a homenagem feita a Adílio, na presença de familiares do amigo que se foi e com Andrade ao lado. Nas arquibancadas, vários pais apontavam ao gramado e diziam aos seus filhos, muitos deles no colo: “Aquele é o nosso rei”. Mais de 40 mil torcedores compareceram ao Maracanã, mesmo com reclamações de muitos que não conseguiram comprar ingresso pela internet.

Em idolatria, apoiado pela maior torcida do país, Zico supera Pelé. Ele liderou o maior time da história do Flamengo e conquistou títulos inesquecíveis, entre eles o do Campeonato Mundial, colocando os ingleses do Liverpool na roda, no dia 13 de dezembro de 1981. A vitória por 3 a 0 acabou sendo “modesta”, totalmente construída no primeiro tempo. Se o Flamengo não diminuísse o ritmo, poderia ter vencido por 4, 5 ou mais.

No site do Real Madrid, há um registro de que em 2024, após 122 anos de história, o clube conseguiu o seu maior número de títulos. Foram cinco conquistas na mesma temporada: Liga dos Campeões, La Liga, Supercopa da Espanha, Supercopa da UEFA e Copa Intercontinental. O Flamengo superou essa marca em 1981, faturando seis títulos, três deles num intervalo de três semanas. O calendário era ainda mais pesado do que hoje. Havia menos competições, mas o Campeonato Estadual tinha três turnos e ocupava todo o segundo semestre. Foi o caso do Estadual de 81, conquistado pelo Fla em dezembro, entre os títulos da Copa Libertadores da América e do Mundial. Antes, já havia sido campeão da Taça Guanabara, da Copa Punta del Leste e do Torneio Internacional de Nápoles. Sem contar que, no dia 8 de novembro, devolveu a histórica goleada de 6 a 0 imposta pelo Botafogo nove anos antes.

Para conquistar a Libertadores, o Flamengo precisou de três jogos finais. Após ter derrotado por 2 a 1 o violento Cobreloa no Maracanã, o time rubro-negro perdeu por 1 a 0 em Santiago. Houve, então, uma partida decisiva no dia 23 de novembro. Zico marcou duas vezes e garantiu o título inédito em Montevidéu. No dia 6 de dezembro, o Carioca foi conquistado com vitória por 2 a 1 sobre o Vasco, gols de Nunes e Adílio, em jogo que também teve como protagonista o folclórico Ladrilheiro. Com o Flamengo sendo campeão, o torcedor  Roberto Passos Pereira invadiu o campo e motivou uma paralisação que esfriou o Vasco, interrompendo a pressão pelo empate que lhe daria o título carioca. Por fim, uma semana depois, o Flamengo venceu o Liverpool, tricampeão da Liga dos Campeões da Europa, por 3 a 0, em Tóquio, com dois gols de Nunes e um de Adílio. Era a conquista do mundo!

Ídolo também no Japão, Zico voltará ao país em junho de 2025, para promover o primeiro Jogo das Estrelas no exterior, em Hiroshima. Que o evento leve paz e alegria à cidade, que tanto sofreu, há 80 anos, com um bombardeio atômico com mais de 200 mil vítimas.

THE BEST

por Elso Venâncio

A rivalidade entre FIFA e UEFA é antiga e ficou mais acirrada com a criação da Copa do Mundo de Clubes. O torneio quadrienal terá sua primeira edição disputada nos Estados Unidos, de 15 de junho a 13 de julho de 2025. Organizadora do evento, a FIFA esperava conseguir 4 bilhões de dólares em direitos de TV e publicidade, mas deve arrecadar em torno da metade do previsto, desagradando a UEFA, que é de longe a federação com maior peso, em termos financeiros e de influência no cenário internacional.

Há uma disputa entre FIFA e UEFA, por poder e dinheiro, em tudo. A cerveja parceira da FIFA é concorrente da cerveja parceira da UEFA. O mesmo acontece com os bancos, bets, refrigerantes, montadoras, e por aí vai…

A FIFA tem a Copa do Mundo, e a UEFA tem a Eurocopa, que só perde em importância para o Mundial. A FIFA acaba de criar uma “Super Champions League”. O formato de disputa é semelhante ao da Copa do Mundo. Serão 32 clubes, das seis federações continentais, divididos em oito grupos. Os dois melhores de cada chave avançam para as oitavas de final, onde começam os jogos de mata-mata. O Brasil será o país com maior número de representantes: Botafogo, Flamengo, Fluminense e Palmeiras.

Organizada pela revista France Football com apoio da UEFA, a Bola de Ouro coroou o espanhol Rodri, do Manchester City, como melhor jogador do mundo na última temporada. Na eleição da FIFA, o prêmio The Best foi destinado a Vinícius Junior.

A entrega do Troféu Bola de Ouro pela France Football começou em 1956. Até 1994, só eram relacionados para a disputa quem atuava na Europa. Romário, eleito The Best após o tetracampeonato mundial da Seleção Brasileira, nos Estados Unidos, nunca conquistou a Bola de Ouro. A France Football convida 200 jornalistas, sendo um por país, para votar. Já a FIFA define sua premiação por meio de votos dos capitães das seleções nacionais, de técnicos, jornalistas e torcedores, estes em votação on-line. Ainda há quem confunda o prêmio oficial da FIFA com a Bola de Ouro.

O The Best foi criado em 1991, com o nome de melhor do mundo, primeiro para os homens e, uma década depois, para as mulheres. Além de Romário, primeiro brasileiro a receber o prêmio, os demais brasileiros premiados são Ronaldo Fenômeno (três vezes), Ronaldinho Gaúcho (duas vezes), Rivaldo, Kaká e, agora, Vinícius Junior.

Vini foi, indiscutivelmente, o melhor jogador do planeta na temporada 2023/2024. Ele se destaca no ataque do Real Madrid, ofuscando o brilho do francês Mbappé; foi destaque da La Liga e novamente decisivo na final da Champions League. Após receber o The Best, ainda foi escolhido o craque da Copa Intercontinental. Vinícius Junior merecia também Bola de Ouro. Ao menos recebeu o The Best, e o Brasil voltou a ter o número um do futebol após 17 anos. O último tinha sido Kaká, em 2007.