por Cesar Oliveira
Para a Copa de 1938, a seleção brasileira reuniu uma penca de craques de alta estirpe. E foi uma Copa de estreias.
Era a primeira vez que o “Scratch” comparecia com força máxima, com a nata dos nossos craques, com destaque para Domingos da Guia, Leônidas da Silva, Batatais, Tim… sobravam craques.
A primeira irradiação ao vivo para o Brasil, e o lendário Gagliano Neto sendo o principal nome do rádio esportivo sul-americano presente ao torneio.
A primeira vez que uma delegação de jornalistas comparecia a um megaevento. Thomaz Mazzoni era um deles, trabalhando para “A Gazeta”!
Foi a Copa que apresentou Leônidas ao mundo. A Copa do famoso pênalti de Domingos em Piola. O terceiro lugar deixando os torcedores em polvorosa, recepção de heróis na volta ao País.
Mas as coisas não foram tranquilas na terra da baguette. Apesar das boas atuações, a imprensa desancava a Seleção. E Mazzoni, conservador e nacionalista, não gostava nada disso: “Infelizmente, nossos craques se deixam explorar pela imprensa que vive de sensacionalismo barato, único meio de conquistar leitores” – escreveu na ‘Gazeta’.
Na volta, registrou sua indignação com os coleguinhas no livro “O Brasil na Taça do Mundo, 1938”. Como registrou André Ribeiro no seu blog Literatura na Arquibancada, “(…) Mazzoni sempre foi extremamente crítico em relação aos seus colegas de profissão”.
Em 1939, aproveitando o sucesso brasileiro na Copa, publicou uma série de artigos na “Gazeta”, com o título “Problemas e Aspectos do Nosso Futebol”, onde falava do atraso da imprensa esportiva, que não teria abandonado os vícios do extinto regime amador.
Parece não ter ficado satisfeito. Tanto que em “Flô, o goleiro ‘melhor do mundo’” aproveitou o romance para, por baixo do enredo com jeitão de água com açúcar, desancar a estrutura do nosso futebol, as relações estranhas de imprensa e jogadores, escalações de árbitros arrumadas em gabinetes de federações, torcedores cornetando jogadores etc
“A imprensa esportiva é quem faz o choro, cria rivalidades e às vezes ódios, mesmo porque o choro não é mais do que um desabafo da paixão bairrista, e que quanto mais se alimenta, mais cega fica”.
“Flô, o goleiro ‘melhor do mundo’” foi lançado em 1941, às expensas do autor, já um jornalista admirado. A leitura que se faz hoje dele, 75 anos depois do lançamento da primeira edição, ajuda a entender o futebol brasileiro. Muito antes do 7 a 1, já cometíamos erros.
Mazzoni formou com Cásper Líbero uma parceria que dominou a imprensa esportiva. Promoveu eventos de vários esportes. Escreveu sobre hóquei e ciclismo, criou bordões e apelidos para clubes e clássicos. Marcou seu nome.
UM LEGADO ÀS FUTURAS GERAÇÕES
Foi André Ribeiro, biógrafo de Telê Santana e Leônidas da Silva, autor do excelente “Os donos do espetáculo: histórias da imprensa esportiva do Brasil” (Terceiro Nome, 2007) quem me apresentou à família de Mazzoni. E, por generosidade deles, tenho a honra de empreender o projeto de reedição das obras de Mazzoni, um legado às futuras gerações de pesquisadores do futebol brasileiro.
Por ter, também, os direitos das obras de Milton Pedrosa, da Editora Gol, decidi reunir esses primevos textos clássicos da literatura de futebol em nosso País na Biblioteca Digital do Futebol Brasileiro, reunindo em cinquenta e-books, a serem lançados até o inicio da Copa da Rússia, em 2018.
No acervo de Pedrosa, uma inédita carta dele para Mazzoni, em que o jornalista rio-grandense do norte agradecia a “dica” do ítalo-paulistano, de que “livros de futebol não vendem muito bem no Brasil”.
Deve ser por isso que Pedrosa registrou, na orelha de “A hora e a vez de João Saldanha” (Editora Gol, 1969) que “não temos tradição de leitura de livro sobre assuntos de futebol, como de esportes em geral”.
Aos que me perguntam – ou estranham… – o motivo pelo qual edito futebol, respondo como Pedrosa (na mesma “orelha”): “(…) com o objetivo de suprir os que não desejam ignorar o que se passa no mundo do futebol”.
A MODERNIDADE NA LITERATURA
A Biblioteca Digital do Futebol Brasileiro, iniciativa da livrosdefutebol.com, tem a intenção de proporcionar, a quem deseja conhecer e pesquisar as origens do nosso futebol, as ferramentas necessárias para fazê-lo com qualidade.
A proposta é reeditar toda a obra de Mazzoni e Pedrosa em e-book. O chamado “livro eletrônico” é, a nosso ver, a melhor maneira de editar o que chamado de “experiência ampliada”. Senão, vejamos:
E-books contornam a necessidade do investimento em papel. Reza a lenda do meio editorial, que editores se suicidam pulando do alto da pilha de encalhes.
E-books nos resguardam do hábito prejudicial adotado por algumas livrarias, de fazerem compras pontuais, às vezes de um único exemplar, para pagar em noventa dias.
E-books permitem atualizações constantes, deixando nas mãos dos leitores sempre a versão mais nova das informações.
E-books permitem a utilização sem limite de links externos – que chamo de “pés de página eletrônicos”, extensões do texto para outros textos e imagens, vídeos e áudios, podcasts e mapas, imagens animadas etc.
Aos clássicos Mazzoni e Pedrosa, vou reunir o que chamo de “clássicos contemporâneos”, os textos de pesquisadores e jornalistas, historiadores e autores dedicados à literatura de futebol.
É assim que reeditaremos toda a obra das duplas Roberto Assaf & Clóvis Martins, e Alexandre & Mesquita e Jefferson Almeida. Que lançaremos os 19 volumes de “Ídolos: dicionários dos craques do futebol brasileiro”, de André Felipe de Lima. Que lançaremos os novos livros que estão em gestação, sempre com uma pegada na história, nas boas biografias, nos estudos técnicos do nosso futebol.
É com alegria que recebemos a adesão de cronista Claudio Lovato Filho e do ex-jogador Humberto Rêdes Filho. E estamos de portas abertas para todos os que compartilhem nosso amor à literatura de futebol e à qualidade dos bons textos.
Que role a pelota!
Se tiver alguma dúvida ou sugestão, fale comigo:
(21)988-592-908 ou livrosdefutebol@gmail.com. Esse celular é Vivo e tem WhatsApp.
UMA VAQUINHA PRA TOCAR O PROJETO
O trabalho da Biblioteca Digital do Futebol Brasileiro me fez lembrar a analogia com os icebergs. Nada mais apropriado nesses tempos em que a Islândia sacodiu o mundo do futebol.
Do iceberg, você só vê a pontinha. Abaixo da linha d’água, um mundo. Fazer livros é assim. O que o leitor recebe nas livrarias e e-readers é só a pontinha do trabalho em que nos envolvemos desde que os autores entregam seus originais.
No caso da recuperação de textos históricos, livros às vezes em mau estado de conservação, o trabalho é enorme. É por isso que a Biblioteca precisa contar com a ajuda de quem acredita no que acreditamos.
Para desenvolver o projeto da Biblioteca Digital do Futebol Brasileiro com qualidade, precisamos contar com a ajuda de colaboradores, até com a aquisição de alguns equipamentos especiais para recuperar os textos a partir de documentos históricos, que precisam ser preservados de danos.
Sabia que a luz dos scanners rouba alguns anos de vida de documentos históricos? Que preservar livros de papel em cidades como o Rio de Janeiro – calor, umidade e maresia – é extremamente complicado?
Por isso, pedimos e contamos com o seu apoio, nessa época complicada, em que as leis de incentivo deverão ser suspensas até que as coisas se arrumem.
Para saber como contribuir com a Biblioteca Digital do Futebol Brasileiro, você pode saber mais da gente em https://goo.gl/uVn2RW e fazer parte do nosso time no Apoia.se — https://apoia.se/livrosdefutebol.
Com contribuições recorrentes e mensais entre R$10 e R$100, você ajuda a recuperar e preservar a memória do futebol brasileiro.
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