por Antônio Carlos Guimarães
Tarde do dia 12 de maio de 1965.
No Rio de Janeiro, Botafogo e Fluminense se preparam para uma partida do Torneio Rio-São Paulo.
Em Aguinhas, Sul de Minas Gerais, no pequeno gramado da pracinha do prédio da antiga prefeitura (onde hoje funciona o fórum), seis meninos, alunos do Grupo João Bráulio, batiam bola.
Ao fundo, na casa do promotor Dr. Ferreira, apaixonado torcedor do Fluminense, no rádio ligado em volume máximo, Jorge Curi preparava-se para mais um clássico do futebol brasileiro — o Clássico Vovô.
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— Já dá dois times, vamu jogar! — disse o Guima. — Três do Botafogo e três do Fluminense, tá dividido. Topa?
— Par! — Ímpar! — Ganhei! — disse o Alexandre — Bola é nossa e ocês tira a camisa!
— Bola só sai na linha de fundo, num vale ficar dentro do gol, canelada é chute direto, dois num é falta, quem isola, busca — um deles anunciou as regras do jogo.
— E num vale bicuda, que a bola ainda nem foi usada — ordenou Andrezinho, o dono da bola de capotão número 3, estalando de nova.
De quatro metades de tijolos montaram as traves. No esquadrão alvinegro, alinharam-se Guima, Xepinha e Rubens Nélson. No tricolor, Alexandre, Zélias e Andrezinho. Guima e Alexandre, zagueiros; Rubens Nélson e Zélias, no meio; Xepinha e Andrezinho, no ataque.
E dois jogos inesquecíveis começaram ao mesmo tempo…
— É goool! Gooooollllll! Jaiiiirziiinhooo, camisa número 7! Eram decorridos seis minutos da etapa inicial! — esgoela Jorge Curi, para alegria do trio botafoguense. Inspirado, Xepinha recebe lançamento de Rubens Nélson e, à lá Jairzinho, dribla dois e anota o primeiro gol.
E jogo que segue, lá e cá…
Durou, no entanto, pouco mais de meia a hora a alegria dos botafoguenses. Em menos de sete minutos escutaram, por três vezes, bordões inconfundíveis do locutor caxambuense, anunciando a virada tricolor, que marcou, sucessivamente, com Evaldo, Antunes e Amoroso:
— Golaço! Açoo! Açooo!!!
— Dá-lhe garoto!
— Anootem!… Teempo e plaacar no Maior do Mundo! São decorridos 42 minutos da etapa inicial. Fluminense 3, Botafogo 1!
— Ééé, mas aqui tá 3 a 1 pra nóis, num dianta chorar — falou Guima tentando abafar a gozação dos tricolores.
— Pois nóis vai virar no segundo tempo! – afirmaram confiantes Rubens Nélson e Xepinha. — Jairzinho e Roberto vão fazê quatro gol!
— Sou tricolor de coração! Sou do time tantas vezes campeão! — prosseguiu zombeteira a torcidinha mirim do Fluminense, sem dar ouvidos às bravatas alvinegras.
Veio o segundo tempo e Antunes, Gílson Nunes e novamente Evaldo selaram a sorte do Botafogo: 6 x 1 Fluminense!
— É goleada! É goleada!
— Aqui tamém é goleada, seus bobo! Tá 5 a 1 pro Bota, hehe!
— Pelada na pracinha num vale goleada no Maracanããã!!!… — devolveu a equipe tricolor.
De repente, no rádio:
— É pênalti para o Fogo! Pênalti!!! — Jorge Curi anuncia.
Expectativa na pracinha.
— Correu, atirou. É gol! Gooolll!!! Gérson, camisa número 10. Eram decorridos 33 minutos de luta na etapa final! Agora, noo placaarrr: Fluminense 6, Botafogo 2!
— Falta 15, ainda dá pra empatar! — Xepinha falou, sem muita convicção.
— Esperança é a última que morre! — Guima tentou animar o trio alvinegro.
— Navio já afundou! Navio já afundou! Num adianta chororô! — Os tricolores, dando pulinhos de contentamento, devolveram no ato.
Mas logo se calaram, pois Xepinha, magoado e de cara feia, meteu a bola no vão das pernas de quantos adversários viu pela frente e assinalou, inapelavelmente, no improvisado maracanã de Aguinhas: Botafogo 7, Fluminense 1.
Mas o sofrimento não havia acabado: aos 35 minutos do segundo tempo Gílson Nunes deu números finais ao que se tornaria o mais triste dia da vida dos meninos botafoguenses: FLUMINENSE 7, BOTAFOGO 2!
E, para cúmulo do azar, Andrezinho marca um gol…
E, assim, no Sul de Minas, em Aguinhas, o jogo também terminava: BOTAFOGO 7, FLUMINENSE 2!…
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— A revanche será no jogo de botão, na sala de tacos da casa do Guima — avisou Alexandre, mordido pela derrota, mas mostrando sete com os dedos para os amigos botafoguenses…
Texto em homenagem a Alexandre, Zélias, Andrezinho, Rubens Nélson e Xepinha — amigos da infância e da bola, que conservo até hoje.
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